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Sunday, June 05, 2011

Entrevista: Lázaro Ramos defende a complexidade do personagem André em Insensato Coração

Em entrevista ao CORREIO, o ator fala sobre seu personagem e, ainda, sobre a expectativa de ser pai



Lázaro é ator, diretor, escritor e apresentador de TV



Foto: João Miguel Júnior/TV Globo


Nilma Gonçalves - Redação CORREIO
nilma.goncalves@redebahia.com.br

Lázaro Ramos tem apenas 33 anos de idade. Mas, a considerar a maturidade que demonstra, parece ser mais velho. Ator, diretor de tea- tro, escritor e apresentador de TV, capaz de ir da comédia ao drama em dois tempos, esse baiano retado é um dos artistas mais talentosos e versáteis de sua geração. Além do mais, costuma usar a arte em prol de discussões úteis para a sociedade - como a questão da negritude -, seja quando apresenta o programa Espelho, na TV Brasil, ou dirigindo a peça Namíbia, Não!, em cartaz em Salvador, no teatro Martim Gonçalves. Chegou a ser considerado pela Revista Época um dos 100 brasileiros mais influentes do ano de 2009. No ar em Insensato Coração, como o mulherengo André, Lázaro não se deixa abater pelas críticas que recebe por não fazer exatamente o tipo galã que o papel (supostamente) exige. “A questão de padrão estético é uma questão ainda discutida no nosso país... Eu não construo o André apenas como um galã”, ressalta. Em entrevista ao CORREIO, o ator fala sobre seu personagem e, ainda, sobre a expectativa de ser pai.

André começou Insensato Coração extremamente mulherengo. Com o tempo, o romance com Carol (Camila Pitanga) parecia que ia despertar nele um lado mais romântico. Isso não aconteceu, mesmo tendo virado pai. Como enxerga esse comportamento?

O André é um personagem que tem várias questões. A principal é o medo de formar uma família por achar que não vai dar conta disso, pelo trauma que ele tem na relação com o pai. E o fato dele ficar com tantas mulheres é apenas defesa, por achar que não é hábil.

Na sua opinião, por que André é tão resistente a experiências afetivas?

Por achar que não é hábil. E é um personagem em que, eu acho que, os autores querem mostrar uma outra forma de constituir família. Principalmente porque o André inaugura um arquétipo de personagem que a gente ainda não viu em telenovela. Tanto que é difícil defini-lo, se ele é um cafajeste, se ele é excessivamente sincero, se ele é arrogante, se ele é traumatizado...

Por que a relação de André e Carol não deu certo?

Eu acho que o André pensou que não fosse dar conta de uma mulher tão independente quanto a Carol e uma mulher, que no meu ponto de vista como criador do personagem com os autores, despertou uma coisa que ele nunca sentiu na vida. Eu acho que ele é apaixonado por ela, mas não sabe como lidar com essa mulher e como lidar com o amor, que foi uma coisa que faltou na vida dele o tempo todo. É um sentimento novo pra ele, por incrível que pareça. Uma pessoa que não tem amor na sua família, pra experimentar isso fora de casa é sempre uma novidade e um motivo de conflito.

A bola da vez agora é Leila, que está disposta a conquistar o designer. Você acredita que ela terá chance?

Eu acho que a Leila tem chance com ele, sim. Principalmente porque ela é um espírito independente que nem ele. Na família dela, Leila não se parece com ninguém. Ela vai pra Londres pra saber o que ela quer de verdade na sua vida. Na maneira de se relacionar afetivamente, vai atrás do orgasmo. Isso é um comportamento diferenciado, principalmente em uma mulher da idade dela. Talvez isso faça com que apareça alguma sintonia entre ela e o André, essa identificação.

Leila não é muito jovem para André?

Amor tem idade? Ela já é maior de idade.

Sua mulher, Taís Araújo, não tem reclamado dessa pegação toda, não?

Não. Porque ela tem a mesma profissão que eu.

Muitos têm afirmado que você não teria o perfil de galã que pede um personagem como André. De que forma lida com essas críticas?

As críticas são naturais. A questão de padrão estético é ainda discutida no nosso país, e é natural que apareça um comentário como esse. A maneira como eu lido é focando no meu trabalho e não reduzindo o meu personagem a uma rubrica. Eu não construo o André apenas como um galã. Eu construo o André, que é um anti-herói, com características às vezes até incoerentes, porque é um cara absolutamente competente e podia ser humilde, mas não é. Ele é arrogante, é um cara que atrai as mulheres e podia escolher a que ele quer, mas tem essa dificuldade emocional de lidar com o assunto família, então, foge dela. Eu trabalho ele com a complexidade que o personagem tem.

Como consegue se dividir entre as gravações da novela, do programa Espelho e de seus outros projetos?

Essa novela é muito especial. Eu agradeço às pessoas com quem eu trabalho. A equipe de produção, direção e os autores, porque a gente tem uma rotina de gravação muito tranquila e com afetuosidade. Então, quando eu vou trabalhar, não tenho cansaço, tenho prazer. O meu programa Espelho, eu gravei todo ele em dezembro do ano passado. Agora, eu estou no processo de edição, e preciso ir uma vez por semana apenas na ilha de edição. E Namíbia, Não!, a peça de teatro que está em cartaz em Salvador, eu ensaiei nos meus intervalos de gravação, porque os autores se predispuseram a emprestar os seus horários aos meus. Então, é fácil. Quando você trabalha com o que você gosta, o trabalho não fica cansativo, é só prazer.

O programa Espelho é um fórum de discussões muito interessante para a TV brasileira. Acredita que deveria haver programas como esse na televisão aberta?

Eu acho que tem espaço sim, porque na TV fechada o Espelho já se mostrou um verdadeiro sucesso. O programa surgiu há seis anos pra ter apenas cinco programas. Eu mesmo achei que seria uma coisa episódica, que não teria mais como abordar esse tema, fazer essas entrevistas. E, de repente, eu já estou há seis anos com esse programa e com a segunda maior audiência do Canal Brasil.

Apresentar um programa é muito diferente de atuar?

É diferente porque eu não tenho a máscara do personagem pra me proteger. Quando eu faço as perguntas, são aquelas que eu realmente quero saber. Eu tenho uma ficha de perguntas, mas, na maioria das entrevistas, não uso, porque procuro abordar as pessoas com a minha curiosidade real e transformar tudo num bate-papo.

Você é um artista múltiplo. Além de atuar e ser apresentador, recentemente lançou um livro infantil e também enveredou pela direção teatral. De onde vem essa inquietude?

Acho que vem do Bando de Teatro Olodum. Durante os dez anos que eu tive atuando diariamente no grupo, o exercício que eu tinha era ser um ator, autor. Ou seja, um ator com opinião. E, ao mesmo tempo, porque no bando, quando não se tinha patrocínio, a gente fazia tudo. Então, no bando, eu fui da equipe de iluminação, da equipe de figurino, da produção... Esse foi o exercício que eu aprendi a fazer. O que me mobiliza é o desejo de me comunicar, e a linguagem que eu vou abordar é a que me parecer mais adequada, no momento.

Como foi o feedback do público com Namíbia, Não!? Pretende levar a peça para outros lugares, fora da Bahia?

Pra mim, Namíbia foi uma grata surpresa, porque a gente fez um espetáculo que tinha o desejo de divertir e provocar reflexão. Em vários momentos eu pensei que a parte reflexiva seria o mote do espetáculo, mas acho que o público da Bahia inclusive tem essa característica de compreender os assuntos que são debatidos na peça. E conseguiram ver o espetáculo com um olhar bem-humorado. Eu fiquei muito feliz com a recepção e foi maravilhoso ter o teatro lotado em todas as apresentações, que é uma coisa difícil hoje em dia. É a minha primeira direção de espetáculo adulto.

Podemos esperar ver Lázaro nos cinemas, em breve?

Com certeza. Tem dois filmes pra estrear. Um é o Amanhã Nunca Mais, do Tadeu Jungle, que provavelmente vai estrear no segundo semestre. E tem um filme que eu fiz em Portugal chamado O Grande Quilape, do Zezé Gamboa, que é um diretor angolano. Não sei se vai estrear este ano, mas é um filme que eu gostei muito de ter feito. Ano que vem eu acho que eu vou me dedicar um pouco ao cinema, porque já estou com saudade.

Agora, você vai acumular também o papel de pai. Como está a expectativa?

Eu estou uma pilha de nervos, mas muito feliz.

Você pretende ser daqueles pais que trocam fralda, colocam pra dormir, acordam no meio da madrugada? Ou acha que isso é tarefa pra mãe mesmo?

Não. Eu sou pai moderno. Tem que participar de tudo.




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