Anuncie Bate-papo Coberturas Home Real Player Windows Media Player Winamp AAC Cabaré da Rrrrraça: January 2006

Cabaré da Rrrrraça

Tuesday, January 31, 2006

O ator Lázaro Ramos revela que, além do Teatro, descobriu na escola pública lições para a vida toda



Quando estudou no Colégio Estadual Anísio Teixeira, Lázaro Ramos ingressou pela primeira vez em aulas de Teatro. O contato com textos interessantes e “com o sentimento das pessoas” veio através de um professor inesquecível e do convívio com a comunidade no dia-a-dia da escola. Nos anos em que freqüentou a escola pública, o garoto tímido aprendeu lições de solidariedade e cidadania, importantes para a formação que precisava para ingressar na profissão de ator, pouco tempo depois, no Grupo de Teatro Olodum.

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Aos 26 anos, Lázaro Ramos é o ator baiano mais prestigiado da atualidade. No cinema, atuou em 11 filmes e recebeu 10 prêmios nacionais e internacionais pela atuação. Na televisão, Lázaro faz sucesso na principal emissora do país.

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É um dos protagonistas do seriado Sexo Frágil - que este ano vai à terceira temporada – e , desde janeiro, estréia como apresentador no Fantástico, do quadro Instinto Humano, com 16 episódios produzidos pela BBC da Inglaterra e que serão exibidos até abril deste ano. Além disso, ele planeja a volta ao Teatro, numa peça que está escrevendo, inspirado nas férias da própria infância.

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Nesta entrevista, Lázaro Ramos incentiva os estudantes afro-brasileiros a acreditar em si mesmos, valorizar a auto-estima e a descobrir o papel transformador que devem ter no mundo. À escola de hoje, ele dá sugestões de como estimular a igualdade entre alunos de diferentes cores e origens. Mas houve espaço para lembranças de menino também: “Na gincana do colégio, tinha aquelas provas engraçadas de conseguir, sei lá, 100 gordos de 20 anos, por exemplo”, sorri.

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1. Como foram seus primeiros anos de escola? Que influência tiveram em sua carreira?

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Lázaro Ramos - Estudei em duas escolas particulares de bairro, uma na Federação e outra no Garcia. Depois fui para o Colégio Estadual Anísio Teixeira, na Caixa D’água, onde entrei em contato com o Teatro. Foi uma experiência maravilhosa de enriquecimento cultural. Tive as primeiras noções sobre a situação do País e suas necessidades. Tive contato com textos e com o sentimento das pessoas. Eu tinha 14 ou 15 anos, e aquele período foi muito importante para minha formação. Lembro da gincana, uma programação que proporcionava muitas atividades tanto de solidariedade – arrecadação de roupas e alimentos - até aquelas mais engraçadas como conseguir 100 gordos com idade de 20 anos, por exemplo (risos). Eram momentos de integração dos alunos com a própria escola.
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2. Qual o professor que mais lhe influenciou?

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Lázaro Ramos - Eu tive a sorte de ter bons professores. Dois deles eu lembro bem. O professor de Teatro, Albérico Alves, que era também o vice-diretor do Colégio Anísio Teixeira, me ofereceu lições de educação muito preciosas e sempre ensinava sobre as nossas obrigações como cidadão. E a professora Idalina Alves, no curso técnico de patologia, em São Francisco do Conde, que dava aulas de Técnica de Patologia, tinha um brilho nos olhos, que não tem preço. É muito difícil se estimular numa escola pública, mas quando os professores têm vontade de ensinar, de preparar os alunos pra vida, isso faz toda a diferença!
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3. O que você mudaria na escola que freqüentou na infância ou na adolescência?

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Lázaro Ramos - Tanta coisa... Principalmente, mudaria o relacionamento entre os professores e os alunos. Daria mais estímulo aos professores para que tivessem mais brilho nos olhos. Mais salários, mais capacitação, mais programas de formação. Também acho necessárias maior quantidade e variedade de matérias opcionais. Acho que matérias opcionais têm maior poder de trazer os alunos para o convívio da escola. Vivi numa época em que a escola fazia parte da comunidade.
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4. Você freqüentou o curso técnico, numa rotina diária que começava às 4h30, incluía ensaios do grupo de teatro Olodum, às 17h, e terminava meia-noite. Qual a importância da formação técnica para o ingresso no mercado de trabalho?

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Lázaro Ramos - O curso técnico foi muito importante pra mim, porque me deu a oportunidade de um trabalho imediato, para me sustentar e sustentar minha casa. Enquanto isso, eu também tive tempo para estudar outras coisas e investir na profissão que eu queria. Eu tenho consciência de que ainda preciso cursar uma faculdade, porque é de fundamental importância para qualquer profissão. Mas, naquele momento, o curso técnico foi necessário para suprir uma necessidade emergencial, digamos assim.
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5. O que é semelhante na dedicação de um bom artista e de um bom estudante?

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Lázaro Ramos - Pra vida toda de todo mundo é muito importante saber escolher bem. A vida de estudante ou em qualquer outra área depende de escolhas bem feitas. É preciso estudar constantemente, não dá para perder tempo. O conhecimento é a única coisa que ninguém pode tirar de você. Tanto para o bom aluno, como para o bom artista também é muito importante acreditar em si mesmo o tempo todo. È preciso que a gente entenda o mundo e entenda que a gente faz parte da mudança que acontece no mundo. A gente não pode ser levado pela maré. O mar também é resultado do movimento que os peixes fazem.
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6. Numa entrevista recente à Istoé, você afirmou “Tem um animal dentro de mim que às vezes salta quando me sinto diminuído, discriminado”. Como você aconselha um jovem negro a lidar com o preconceito na escola ou na vida profissional?

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Lázaro Ramos - A auto-estima é fundamental. Pode empinar o nariz, porque faz parte. Em qualquer área da vida, tem que se gostar, acreditar em si mesmo. A gente não pode se deixar diminuir; precisa saber e exigir mesmo os direitos. As nossas qualidades profissionais, éticas e de caráter ninguém pode tirar da gente.
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7. No seu novo filme “Meu tio matou um cara”, o Duca (personagem vivido por Darlan Cunha) comenta ser o único aluno que ninguém pode chamar de “idiota” dentro da classe, porque a professora sempre o defende por ser negro. Como a escola pode se preparar para lidar com questões de racismo?

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Lázaro Ramos - Eu acho que a escola deve tratar com igualdade todos os estudantes, defendendo a valorização do caráter e das qualidades de cada um, independente da cor. Acho que uma boa estratégia para o professor incentivar a igualdade é utilizar trabalhos em grupo, mesclando meninos de todas as cores e origens, integrando os alunos em atividades de parceria. O professor também pode estimular o aluno a se sentir bacana, elogiar, pegar na orelha mesmo e dizer que vale a pena se esforçar para fazer o melhor na escola.

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A comunidade de afro-brasileiros tem uma defasagem, a nossa base de educação é fraca. É preciso que o ensino de base seja fortalecido, senão, no momento em que você concede cotas, você está dando e tirando ao mesmo tempo, porque coloca na universidade uma pessoa que não tem preparo para acompanhar. Acho que o sistema de cotas é necessário, porque há anos o percentual de afro-brasileiros na universidade é muito pouco.

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Olha, outra coisa que eu noto é que faltam nos currículos a história e a cultura da população negra. Na época em que eu estudava, esse assunto era dado numa parte muito pequena dos capítulos. Podia-se falar mais dos heróis negros, mais da história de Zumbi. Estudar esses temas seria muito importante num ambiente tão rico como o universo escolar.

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Foto: Paulo Batelli/ÉPOCA e Dominique Valansi

Quadro 'Um dos três' volta ao 'Fantástico'


O "Fantástico" volta a apresentar neste domingo o quadro "Um dos três". O programa vai contar com os atores Lázaro Ramos, Mauro Lúcio Filho e Pedro Cardoso. Eles contarão uma história que aconteceu com um deles e o público terá que descobrir qual deles está falando a verdade. A criação é de Jorge Furtado, com direção de Marcio Schoenardie e produção de Bel Merel.
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Jornal Extra/Globo Online

Lázaro Ramos grava documentário

NEGRITUDE O ator Lázaro Ramos grava documentário inédito sobre os negros para ir ao ar no Canal Brasil, em julho.
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Fonte: Jornal da Paraíba

Lázaro Ramos curte festa pré-carnaval em Salvador


Lázaro Ramos tem aproveitado o tempo de folga para curtir as festas de Salvador. Na última quinta-feira (26), o ator assistiu ao show do grupo Ara Ketu com a banda Jammil e Uma Noites na capital baiana.
Após o ensaio para o carnaval, Lázaro cumprimentou o cantor Tuca Fernandes, vocalista da banda Jammil e Uma Noites.
Fonte: BABADO

Friday, January 06, 2006

Uma entrevista com LÁZARO RAMOS

Aos 26 anos, o baiano Lázaro Ramos é, sem dúvida alguma, um dos melhores atores do Brasil. E, considerando seu curto tempo de carreira, um dos mais premiados também. Atualmente ele apresenta o quadro Instinto Humano, do Fantástico, mas onde se notabilizou mesmo foi no cinema, contabilizando nada menos que quatro grandes sucessos de bilheteria (Madame Satã, O Homem que Copiava, Carandiru e Meu Tio Matou um Cara). Além disso, fez uma minissérie (Pastores da Noite), um seriado de humor (Sexo Frágil) e duas peças no eixo Rio-São Paulo (A Máquina e As Três Marias). Antes, lá no começo, trabalhou com o Bando de Teatro Olodum, em Salvador, onde o diretor Márcio Meirelles deu início a sua formação de ator. Seu retorno às telonas está previsto para breve. Estreará em dois filmes: Cafundó e Cidade Baixa.
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Vivaldo Lima Trindade - Algum dia você imaginou que faria tal sucesso enquanto artista?
Lázaro Ramos - Para responder isso, eu preciso sempre dizer o que é sucesso para mim. E sucesso está diretamente ligado a conseguir realizar seus objetivos com solidez. Eu já estava vivendo um sucesso, por fazer parte de um grupo de teatro como o Bando de teatro Olodum, que estava sempre produzindo, apesar das milhares de dificuldades, e estar mandando sempre uma mensagem importante como a que o Bando tem. Agora, esse "sucesso" de hoje em dia é reflexo da boa base que o Bando me deu, então eu fui me conscientizando dele aos poucos... E me conscientizando realmente de que esse sucesso está ligado às minhas crenças artísticas. Então, quero continuar ligado à minha origem e à proposta de levar entretenimento com qualidade e reflexão para as pessoas. Se eu conseguir isso, aí sim posso dizer que obtive sucesso artístico.
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VLT - Qual o maior desafio de sua carreira até os dias de hoje? E porquê?
LR - Felizmente, eu tive trabalhos que me proporcionaram a sensação de estar sendo desafiado. Desde o Bando, quando Márcio, num gesto de confiança, me desafiou a substituir o protagonista no mesmo dia que a peça seria encenada. Não saberia dizer o maior, porque só o fato de ser ator já é um desafio constante, onde não temos segurança de nada, onde tudo sempre e um recomeço, onde escolher é um desafio... Vou citar como exemplo, mas não como maior desafio, o filme Cidade Baixa, de Sergio Machado, todo filmado na Bahia. A preparadora era Fátima Toledo (a mesma do Cidade de Deus) e, depois de eu já ter feito vários filmes, ela nos fez (atores) por em dúvida tudo o que nos achávamos saber, porque o trabalho dela consiste - resumidamente - em perceber quem somos, para depois perceber quem é o personagem que vamos contar. E olhar para dentro de nós mesmos foi um desafio que me custou um tempo e algumas noites de insônia, até descobrir como trabalhar com essa informação.
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VLT - E o papel que lhe deu maior tesão, que lhe deixou mais satisfeito?
LR - Não posso responder essa também, porque eu tive a sorte de trabalhar com histórias, colegas e diretores que sempre me deram prazer. Todos os papéis, felizmente, foram muito prazerosos, inclusive em suas diversidades. Não posso dizer qual foi o mais intenso, se quando passei por Sancho Pança, Zumbi dos Palmares, Madame Satã, o homem que copiava, Priscila ou Deco, do Cidade Baixa. São tesões distintos.
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VLT - Inicialmente você trabalhou com teatro, depois migrou para o cinema e para televisão. Em sua visão, qual as diferenças mais fundamentais para o trabalho do ator nesses três veículos? Você seria capaz de julgar a importância de cada um deles para o público?
LR - Para mim, a grande diferença é o tempo e o aprendizado de como lidar com cada um deles. Na televisão, o aprendizado é como manter a qualidade com uma demanda grande de cenas por dia; no teatro, as descobertas são constantes, e uma rotina gostosa onde você vai repetindo a mesma história e, no último dia de temporada de um espetáculo, ainda há o que aprender com aquele texto. O cinema tem um tempo maior de construção de cada cena. A importância de cada um deles é uma resposta meio individual e pessoal: A da tevê é o alcance; a do cinema é a sensação de ter um trabalho que vai perdurar por mais tempo; a do teatro é a sensação única que cada espetáculo tem, portanto é uma emoção que talvez jamais se repita.
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VLT - Tem-se a impressão que o método de Stanilawski ainda não caducou na preparação do ator, que as "melhores" atuações ainda são consideradas as mais realistas. Márcio Meirelles, com quem você trabalhou ainda em Salvador, usa de uma metodologia diferente, não? Qual era o processo do Bando de Teatro Olodum? Como ele lhe influenciou para ser o ator que é hoje?
LR - Eu acredito numa coisa em relação ao método do ator; para mim, não ha uma só verdade. O nosso trabalho está ligado ao ser humano. Ser humano esse que tem várias culturas, várias personalidades... Enfim, existem milhares de possibilidades. Então, acho que para contar a história de cada ser humano podemos usar o que melhor nos convém. Acho que isso vem do Bando, onde o trabalho de improvisação sempre foi muito usado. E do fato do Márcio trabalhar o ator consciente do que está dizendo, dando sempre o nosso depoimento pessoal, faz com que sejamos "atores massa de modelar". Ou seja, estamos disponíveis para viver vários métodos e várias situações. Tudo é útil. É o espaço da diversidade e escolha até para o ator. Eu sempre uso em cada trabalho um método inventado, que é a mistura de todos e ao mesmo tempo de nenhum deles.
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VLT - Ainda se faz imprescindível viver no eixo Rio-São Paulo para se ter uma carreira bem sucedida? O fato de ser um ator negro ajudou ou atrapalhou em alguma medida?
LR - Vou lhe responder diferente... Acho que o imprescindível é continuar em seu local de origem e lutar para o crescimento da cultura local. Claro que com isso não estou dizendo que estar em seu local de origem seja fácil também. O que quero dizer é que são dificuldades diferentes, mas que em qualquer lugar vão existir. Falo que é imprescindível a permanência, porque tenho um exemplo vivo e de grande eficácia que é a Casa de Cinema de Porto alegre. São um grupo de 7 amigos, entre eles o Jorge Furtado, que optaram desde os anos 70 em ficar no Rio Grande do Sul e produzir filmes, inicialmente curtas, buscando alternativas variadas. E, hoje em dia, graças a persistência dessas pessoas, transformou o Rio Grande do Sul no terceiro pólo produtor de cinema brasileiro, ficando atrás apenas de São Paulo e Rio de Janeiro. O fato de ser um ator negro, não sei se ajudou ou atrapalhou, mas o fato de ser um ator negro do Bando de Teatro Olodum, e que teve a sua formação num dos períodos mais produtivos do teatro baiano, com certeza ajudou. Acredito que além da minha formação, do meu talento e dedicação eu fui privilegiado em ter pessoas que apostaram em mim, desde João Falcão, quando me chamou para fazer o espetáculo teatral A maquina, até Karim Ainuz, que apostou em mim para protagonizar o Madame Satã.
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VLT - Você também tem seus ídolos? Quem você admira dentro ou fora do Brasil?
LR - Tenho muitos ídolos e referências, acho que usaria muito do seu espaço para falar deles. Vou dar 2 exemplos do que fazem uma pessoa ser admirável para mim. Para ser um ídolo, a pessoa tem que ser além de um bom profissional, naquilo que fizer, um bom ser humano. Eu não acredito num bom profissional mau caráter. Então, Zebrinha (coreógrafo do balé folclórico da Bahia e do Bando) se encaixa muito bem nesse perfil, ele é de uma competência admirável e do coração do tamanho de Marte. Meu próprio pai é um exemplo disso, um homem batalhador, que veio do interior da Bahia e conseguiu me educar e auxiliar a família sempre. Claro que admiro muito também Pedro Cardoso, Zé Dumont, Spike Lee, Mario Gusmão... Enfim... 372 outros, mas isso fica pra próxima entrevista.
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VLT - Com que diretor você gostaria de fazer um novo trabalho no cinema? Tem visto novos filmes? O que tem lhe agradado?
LR - Sendo bem sincero, eu admiro o trabalho de vários cineastas brasileiros. Poderia citar vários nomes, mas o que me inspira mesmo num trabalho é a história, e muitas vezes boas historias estão nas mãos de diretores que nunca fizeram um longa metragem sequer. A energia dos jovens diretores me instiga muito. E acompanho sim o cinema nacional. Ultimamente os dois filmes que me agradaram, só para dar 2 exemplos dentro do muito que é feito hoje em dia, foram Quase Dois Irmãos, da diretora Lucia Murat com Flávio Bauraqui e Caco Ciocler, e o belíssimo Filhas do Vento, de Joel Zito Araujo.
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VLT - E no teatro? Trabalharia com Zé Celso Martinez?
LR - Claro que sim. Aliás, já fiz duas leituras com ele e foi muito bom. O Zé tem um trabalho desafiador e ao mesmo tempo muito prazeroso. É uma experiência rica trabalhar com ele. É bom porque desarma o ator, dá liberdade, vontade de arriscar, de se desconstruir.
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VLT - Fale um pouco de seus projetos mais recentes, do que está por vir.
LR - Estou fazendo um filme rodado no México, Argentina, Nova York e Brasil, até junho, dirigido por Jean Poul Le Duc, diretor de Frida (1985) e México Insurgente (1990), baseado em contos do Rubem Fonseca. O Filme se chama "O Cobrador" e eu faço o próprio. Está sendo bom conhecer o trabalho de uma equipe de outro país, e estar a cada dia passando por culturas diferentes. Mas daqui a pouco vou estar me ocupando com a divulgação do filme Cidade Baixa, dirigido por Sérgio Machado. Filme todo rodado na Bahia e com elenco baiano. Inclusive, o outro protagonista é meu irmão Wagner Moura. É um filme que eu tenho certeza que o público baiano vai se identificar muito e vai correr para o cinema, afinal de contas, na retomada, o baiano se viu pouco na telona.
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Lázaro, o premiado

Festejado pela crítica, o baiano de 26 anos de idade que acaba de conquistar prêmio no 33º Festival de Gramado, fala da profissão de ator
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Por: Jeane Borges
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O baiano Lázaro Ramos não hesita na resposta ante a pergunta metafórica: “Você tem fome de quê?” “De aprender”, diz. Não, não se trata de uma saída politicamente correta. É a convicção de quem dá duro no batente e no palco, colhendo reconhecimento e credibilidade no teatro, em cinema e na TV.
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Lázaro, que se diz um homem comum, comemora, no momento, o prêmio de Melhor Ator no 33º Festival de Gramado por sua atuação como o preto velho João de Camargo, no filme Cafundó. Diz estar “superfeliz”, mas afasta qualquer hipótese de deslumbramento por conta da notoriedade. “A popularidade é bacana, mas a gente não pode acreditar que isso é tudo”.
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Com um pé no cinema (atua no filme Cidade Baixa, com pré-estréia marcada para outubro, em Salvador) e outro na TV (quadro no Fantástico), o escorpiano de 26 anos acumula os elogios da crítica especializada, e sabe que a sua história difere da maioria dos atores negros do País.
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Ramos vincula a sua história vitoriosa ao Bando de Teatro Olodum, a escola que o formou e à qual se sente ligado até hoje. Foi lá que começou a fazer teatro aos 10 anos de idade. De lá partiu para ganhar destaque na cinematografia brasileira em filmes como Madame Satã, de Karin Aïnouz, O Homem que Copiava, de Jorge Furtado, O Homem do Ano, de José Henrique Fonseca, e Carandiru, de Hector Babenco.
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Nesta entrevista por telefone, do Rio de Janeiro, Lázaro fala de arte, vida, amigos e amor e da desilusão com o governo do mensalão, dos escândalos e da crise generalizada. “Temos que manter uma vigilância constante sobre nossos governantes”.
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A TARDE - O prêmio de Melhor Ator no 33º Festival de Gramado, por sua atuação no filme Cafundó, foi surpresa ou já era esperado ?
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Lázaro Ramos – Foi surpresa. No filme, fiz um trabalho de risco. Interpretei um personagem dos 20 aos 85 anos de idade. Meu personagem foi construído na nobreza daquele cara, o João de Camargo. Na verdade, não fico esperando prêmios, não. Tanto é assim que na hora de ir ao festival (de Gramado) indiquei como representante o Leandro da Hora, que no filme fez o personagem Firmino, o melhor amigo do João de Camargo. Eu não esperava mesmo (ser premiado). Eu tava em Sorocaba quando o prêmio foi anunciado, no sábado passado. Recebi a notícia por Jorge Furtado, diretor do filme O Homem que Copiava.
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Qual a sensação quando a notícia chegou?
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Fiquei superfeliz, porque é importante uma história não oficial como a do preto velho João de Camargo ganhar visibilidade. O João de Camargo não é exatamente o vencedor da guerra. É um cara que teve contato com a sua fé e, dentro disso, inventou uma religião que é a junção de todas as religiões. No altar dele tem, ao mesmo tempo, a imagem de Getúlio Vargas, a de Iansã e a cruz de Jesus Cristo. O meu personagem é montado na biografia de João de Camargo.
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A construção do personagem foi muito difícil?
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Não foi nada simples, porque fazer personagem de um velho pode cair na caricatura. Mas descobri um truque que me ajudou muito. Vi as fotos dele, percebi que era um homem nobre, sereno e tinha um olhar no futuro. Resolvi construir o personagem com base nessas características.
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Como foi a experiência de ser dirigido por Paulo Betti na sua primeira incursão cinematográfica nesta função?
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A direção, na verdade, foi de Paulo Betti e de Clóvis Bueno (que fez também Carandiru). Betti conheceu Camargo, teve uma relação próxima com ele e, ao fazer a direção, ele era coração, deixou prevalecer o lado emocional. Já Clóvis permaneceu mais distanciado, tinha uma visão mais crítica da história. Isso deu um equilíbrio bacana.
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Em alguma ocasião sentiu mais dificuldade para atingir metas por ser negro e pobre neste País miscigenado?
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Em se tratando do meu trabalho, se eu disser que sim é mentira. Mas existe isso. A qualidade e a quantidade de papéis não são iguais para atores negros no Brasil, em relação aos outros. Vou dar um exemplo: em uma dessas novelas havia duas empregadas domésticas, negra e branca. A branca tinha uma inserção na dramaturgia, engravidava do patrão e a negra dizia apenas: “Sim, dona Helena; não, dona Helena”. Mas isso vem mudando, vem crescendo a participação dos negros na dramaturgia. Não passei por isso porque minha experiência profissional começou com o Bando de Teatro Olodum, grupo formado por atores negros, que se preocupa com essas questões artísticas e sociais. O Bando me abriu várias portas. O diretor João Falcão, de teatro e de TV, também me deu várias oportunidades. Ele dirigia (a série) Sexo Frágil. Mas esse meu reconhecimento vem junto com trabalho e dedicação. Agora, quem pode transformar essa realidade das diferenças é o público. É ele que pode exigir personagens que se pareçam com ele. É ele que pode dizer que quer se ver na tela.
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Você trabalha no filme Cidade Baixa, que tem estréia marcada para outubro próximo, não é?
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Em outubro vai acontecer a pré-estréia em Salvador, a estréia nacional acontecerá em novembro. Cidade Baixa é um filme belíssimo, tem uma alegria bacana, mostra o lado emocional baiano. O filme passa o desejo de ser feliz, de amar, de ser tolerante. Foi exibido no Festival de Cannes e ganhou o Prêmio da Juventude, foi escolhido como o melhor por uma platéia jovem. Em Salvador, já foi exibido para duas platéias, uma delas no Candeal. Esse filme tem 95% do elenco formado só por atores baianos – André Elia, João Miguel, Wilson Mello, Maria Menezes, Débora Santiago, Wagner Moura, Divina Valéria, Zeca Abreu, Harildo Déda. O diretor Sérgio Machado também é baiano. A Bahia merece esse filme que conta a história de um triângulo amoroso. Todos se amam intensamente – dois homens e uma mulher.
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O seu momento profissional se revela bastante rico: premiações, novos desafios, trabalho em cinema, em TV. Tem fórmula para o sucesso?
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Trabalho, dedicação. Não tem sucesso fácil.
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Na TV Globo, você participa de um quadro no Fantástico e compôs o elenco da série Sexo Frágil. Mudou muito sua vida com o trabalho em um veículo que atinge grandes massas?
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Acho que tem um diferencial trabalhar na TV, uma abordagem mais íntima do que no teatro e no cinema. Isso é bacana. Mas a realidade não mudou muito, porque os anseios são os mesmos. A popularidade é bacana, mas a gente não pode acreditar que isso é tudo. Sei lidar com isso. A escola que me formou, o Bando de Teatro Olodum, me ensinou que o deslumbramento é uma coisa que a gente tem que deixar de lado. O Bando é a minha grande escola.
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Clichê dos clichês. O preço da fama é alto?
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Não é não. (A senadora) Heloísa Helena (PSol-AL) disse – não sei se ela citou a frase de alguém –, que o poder não corrompe o homem, revela o homem. Você aprende a lidar com isso. Acredito nisso.
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Lázaro Ramos: “Sou um operário”.
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A TARDE – O sucesso não veio nada fácil para você, a julgar por sua caminhada de vida.
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Lázaro Ramos – Acho que tudo que vivi até hoje me trouxe pro chão, me ajudou. Isso só contribuiu para valorizar minhas conquistas, minha personalidade. Na verdade, sou um operário, isso não é uma festa.
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Como é essa história de trabalhar como técnico de patologia antes de seguir carreira artística?
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Era ótimo. Eu adorava. Só era ruim porque eu tinha que acordar todo dia às 4h30. Adoro tirar sangue (risos). Trabalhei em um hospital público durante dois anos em São Francisco do Conde (município baiano).
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Foi o Bando de Teatro Olodum que lhe deu régua e compasso para levar arte para o mundo. Como você descobriu o Bando?
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Descobri o Bando quando fazia o curso livre de teatro no Colégio Anísio Teixeira. Fiz um teste lá com meus amigos, me apaixonei pelo espetáculo Ó Pai Ó. Passei na audição, entrei pro Bando e me considero dele até hoje.
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Como é sua rotina?
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Trabalho muito sozinho. Quando não estou na gravação do Fantástico, fico em casa lendo ou no computador tentando escrever peças e projetos. Quando não tenho patrão, trabalho por conta própria. Em momentos de lazer, vou à casa de amigos como Wagner Moura, Zéu Britto e Wladimir Brichta, vou ao cinema. Tenho um desejo muito grande de ser diretor de cinema e teatro. Quero ser empreendedor para produzir as minhas peças.
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A relação com a família é legal?
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É ótima. Infelizmente, a distância é grande, mas a gente se fala toda semana. Mesmo estando distante me sinto cuidado. Minha família é muito carinhosa, meus pais e minha irmã, Viviane, de 18 anos.
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No seu pique de vida há tempo para romance? Está amando?.Estou namorando a (atriz) Thaís Araújo há um tempinho.
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Que tempinho?
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Quando a pessoa fala um tempinho é porque o assunto encerrou (risos). Tenho que preservar minha vida pessoal.
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Tem novos projetos de trabalho já engatilhados?
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Não. Agora vão começar as estréias de Cidade Baixa e A Máquina (filme dirigido por João Falcão). Eu faço o personagem de um doido em A Máquina.
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Brasil do mensalão, do escândalo dos Correios, da corrupção, da crise generalizada. Você acredita no governo brasileiro?
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Não sei mais no que acredito. Acredito na necessidade de ter muita consciência na hora de votar. Temos que manter uma vigilância constante sobre nossos governantes. Isso vale para todos os brasileiros. A gente imaginava que a esquerda era pura e 100% honesta. Infelizmente, a gente percebeu que há pessoas que não são honestas. Continuo acreditando na esquerda, mas agora vamos ter que selecionar quem vai defender nossos interesses, mesmo dentro da esquerda.
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Você está morando no Rio? Bate paranóia com a violência divulgada em cada esquina carioca, em cada canto do País?
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Moro no Rio. Às vezes fico assustado com a violência, mas não deixo isso me paralisar, não. Moro no Rio há cinco anos e nunca sofri qualquer violência.
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Como é Lázaro Ramos na intimidade?
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Sou bastante comum e gosto muito de ser assim: hábitos comuns, uma pessoa que erra, tem enxaqueca e desejos, igual a todo mundo.
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Você tem fome de quê?
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De aprender.
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Fonte: A TARDE